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  • Foto do escritorTiago Silva

Os perigos de “domesticar” os adolescentes com dinheiro



Há pais que pagam aos filhos para fazerem tarefas domésticas, para que sejam bons alunos ou para que se portem bem. Será que o dinheiro subverte a educação?

A frase é de Antoine de Saint- Exupéry, o famoso autor de O Principezinho: “Tenho o direito de exigir obediência porque as minhas ordens são sensatas”. Uma sentença que não deve ter sido escrita para adolescentes, aqueles seres que, durante algum tempo, tudo questionam e põem em causa. Mas não fique assustado: este é um processo absorvente de mudança, quando a vontade de agradar sofre profundas alterações. Na adolescência, o que o jovem quer é agradar a si próprio e aos amigos, deixando as expectativas dos pais para trás.

Além disso, e como explica um artigo da Psychology Today assinado por Carl E. Pickhardt, psicólogo norte americano e autor do livro “Sobreviver à adolescência (do seu filho)”, o adolescente já não vive na “era do comando, quando as crianças tinham a ilusão de um controlo total dos pais”. Duro? Talvez. “Um adolescente não é uma criança. Agora ele vive na ‘era do consentimento’ e acredita que os pais não podem obrigá-lo nem impedi-lo de agir sem o seu consentimento”.

É claro que é mais difícil para os adultos obterem o que querem – e quando querem – de um adolescente do que de uma criança dependente, ou seja, até aos 7 ou 8 anos. Mas a perda da influência tradicional dos pais tem de ser enfrentada na adolescência. “Agora, eles têm de convencer os filhos, o que nem sempre é fácil – nem rápido”. Eis alguns truques de persuasão que os adultos usam para obter a cooperação dos filhos:


O dinheiro é o mais importante

“Se acha que uma criança é cara, espere até ter uma adolescente!”, brinca o especialista norte-americano, explicando que, na adolescência, aumenta a valorização do dinheiro e a noção do que este pode proporcionar. Nesta fase, diz, os jovens desenvolvem desejos mundanos, anseiam por ter bons gadgets, roupa de marca e dinheiro para uma vida social mais intensa. Na verdade, “o dinheiro compra a probabilidade de pertença social. E pode não garantir uma sensação de bem-estar duradoura, mas oferece um prazer momentâneo”. Mas será que os pais devem oferecer ou negar dinheiro para conseguir o que pretendem?”, questiona o especialista. “Até que ponto é que essa mercantilização da obediência é saudável? Até que ponto os pais querem usar dinheiro para moldar o caracter dos filhos?” Pickhardt fala em várias situações que banalizam a troca de dinheiro por um determinado comportamento: tarefas domésticas, resultados escolares e cumprimento das regras sociais.


Pagar pelas tarefas domésticas

Alguns pais justificam este comportamento como forma de ensinar os filhos a trabalharem para ganhar dinheiro. Muitos dizem: “Nós temos um emprego, vocês não; por isso, pagamo-vos para se ocuparem das tarefas da casa e assim aprendem o valor do trabalho e a sua recompensa”. Mas para outros educadores, esse pagamento põe em causa valores como a solidariedade. “Para ajudar nas tarefas mais básicas, ninguém é pago, mas todos ganham com isso. Os pais que pensam desta forma olham para o trabalho doméstico como uma contribuição natural – e saudável – de todos os membros da família.” Outros pais associam o cumprimento de tarefas à mesada. É natural dizerem: “Quando acabares o trabalho doméstico receberás a mesada.” Assim, a retenção do dinheiro é uma espécie de alavanca para a realização do trabalho. E que dizer dos que desobrigam os filhos de qualquer tarefa doméstica por considerarem que assim não estão a promover um espírito de livre escolha? Sim, estes pais assumem eles próprios todas as tarefas, considerando que é algo inevitável na vida familiar e esperando que um dia os filhos se ofereçam para ajudar…


Pagar por boas notas

A recompensa monetária dos resultados escolares pode criar dois tipos de problemas, explica o psicólogo. Por um lado, há como que uma espécie de ameaça, por outro, um comprometimento da verdadeira motivação. “Como é que receber 20 euros por um BOM pode ser uma ameaça e não uma recompensa?”, questiona Pickhardt. Para logo responder: “Um adolescente contrariado pode entender a situação como uma chantagem. E pensar: ‘muito obrigada, mas as minhas notas não estão à venda’”. Assim, “um problema de desempenho acaba por transformar-se numa questão de poder. Pela minha experiência, esse tipo de incentivo tende a funcionar melhor com crianças do que com adolescentes”. Mais: “Quando pagam pelas notas, os pais fazem do empenho académico uma questão de motivação extrínseca, quando o desenvolvimento da motivação intrínseca é o que realmente conta”. O especialista diz que é melhor explicar ao jovem que todo o esforço que ele faça reverte, antes de mais, a seu favor. Uma consequência negativa de os jovens não aprenderem a criar os seus próprios estímulos é que quando chegam ao ensino secundário percebem que não desenvolveram a autodisciplina e a motivação suficientes para estudar e fazer os trabalhos de casa sem o apoio dos pais.


Pagar pela paz social

Quando os pais chegam ao ponto de oferecer dinheiro ao jovem para respeitar as normas da família, é porque estão cansados e desistiram de educar. “É mais fácil pagar do que discutir”, diz o psicólogo. Ao optarem por este caminho, os educadores podem encontrar muitas armadilhas. Como o acatamento de ordens depende de um valor monetário, se ele não existir, a vida em comum torna-se uma anarquia. “Na melhor das hipóteses, comprar um comportamento aceitável pode parecer suborno e, na pior, extorsão”, explica o especialista. O que fazer para não cair neste esquema? “Em vez de usar o dinheiro como instrumento de gestão, os pais devem insistir na reciprocidade”. Expliquem ao jovem que todos fazem parte de uma célula familiar e que há regras básicas. Se cada um se ajustar a elas, os laços fortalecem-se e todos aprendem a melhorar.


Adaptado de lifestyle.sapo.pt

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